quarta-feira, 22 de junho de 2011

DIZIDELAS do Ti ARTUR (parte_2)

Um dia perguntaram-lhe na rua se ele tinha troco de 100 escudos, e a resposta foi a seguinte:
- AQUI NÃO TENHO.
- E EM CASA?

Perguntou-lhe o interessado:
- EM CASA ESTÁ TUDO BEM MUITO OBRIGADO!
Vila Nova foi, antes da generalização do ensino, era uma terra que se destacava por ter pessoas no seu seio com cultura acima da média.
E eu que tenho setenta anos, lembro-me que na década de trinta, já existia no exército o sr. Capitão Martins, na igreja católica, o sr Padre Martins e o sr Cónego TOMÁS PÓVOA que foi durante muitos anos, reitor do Seminário da Figueira da Foz que, cuja autarquia não o esqueceu dedicando-lhe uma rua com o seu nome.
Aqui na sua terra natal, não houve nem um beco para lhe dedicar, (senhores da autarquia, ainda estamos a tempo!).
Na década de sessenta, apareceram então os primeiros professores do ensino primário (hoje ensino básico) Joaquim Póvoa e Virgínia Serralheiro, pouco depois a Irene Costa. Duas décadas mais tarde, apareceram então advogados, médicos, juízes, engenheiros, técnicos de saúde e mais tarde professores do ensino básico e secundário e para perdoar os nossos pecados, mais um padre e para curar as nossas maleitas uma médica.
É aqui que entra de novo o ti Artur, com mais “uma” das dele.
E ele que via todos os dias passar os estudantes para as aulas, em Cantanhede. Depois no final do ano lectivo, ouvia as mães dizerem com alguma vaidade:
- Olha! o meu filho passou.
- Ah! o meu também.

E o ti Artur dizia:
- PASSARAM, PASSARAM, PARA LÁ E PARA CÁ, QUE EU BEM OS VI!....
Quando o Ti Artur passava na minha rua... dizia:
- Hoje vou jantar à figueira.
E eu que era miúdo pensava que ele ia à Figueira da Foz, e eu perguntava porque é que não me levava com ele, que sou o seu sobrinho mais novo?
Mais tarde descobri que levava um bocado de broa no bolso para comer com figos numa figueira que ele tinha numa terra aqui próximo.

Nós costumamos, quando estamos sentados e nos levantamos, dizer:
- OU UPA!..
E ti Artur dizia:
- E enquanto fizermos UPA para cima, ainda vai tudo bem, mal vai é quando já fazemos UPA para baixo.
Isto quer dizer que ao sentarmo-nos, já temos muita dificuldade e gritamos, AI..AI...AI…
Sinónimo de velhice!
Com a idade, ti Artur queixava-se com dores, e nós num tom irónico, dizíamos-lhe que era manha, e ele respondia-nos assim:
- Quando vocês chegarem à minha idade, DEUS QUEIRA QUE NÃO!... Vocês verão.
Também tinha um pouco de filósofo, dizia que tudo o que se diz, ou houve ou há ou está para haver. Quando tivemos acesso ao telefone, isto por volta de 1952, um irmão meu (Idálio) , que vivia com ele tinha uma exploração de calcário e fornecia cantarias.
Os clientes necessitavam de o contactar pelo dito telefone. Um dia estava sozinho em casa, quando o telefone tocou e o ti Artur, embora não sendo seu hábito, foi atender e ao levantar o auscultador, não deixou que ninguém lhe perguntasse nada, e disse.
- NÃO ESTÁ CÁ ELE, NEM ESTÁ CÁ ELA, E SE EU CÁ NÃO ESTIVESSE, NÃO ESTAVA CÁ NINGUÉM.
E pousou de novo o auscultador.
Isto não se sabia se não fosse o cliente do Idálio a perguntar-lhe se ele não tinha um tolo em casa, para quem o conhecia não era tolo nenhum!

Um dia, foi com um carro de azeitona para o lagar, fazer azeite e já chegou muito tarde... e com uns copos a mais. Ao deitar-se pendurou a roupa na barra da cama, que era de ferro, e a candeia de azeite também, que era a electricidade dos pobres, e adormeceu.
No dia seguinte foi encontrado, pelos vizinhos, atraídos pelo fumo que saía de casa, estava no chão inanimado, fora da cama da qual só restou os ferros.
Dali foi parar ao hospital, onde permaneceu algum tempo a ser tratado das queimaduras graves que sofreu.
Quando lhe perguntavam:
- Então ti Artur, o que lhe aconteceu?
Ele respondia assim:
- FOI O DIABO! A TENDA ARDEU (isto referindo-se à cama), MAS O TENDEIRO FICOU!...
As enfermeiras eram religiosas, e queriam que ele as tratassem por irmãs, e ele que não era nada dessas “coisas”, dizia assim:
- IRMÃS? IRMÃS DAS IRMÃS DELAS, O MEU PAI FÊLAS?

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