segunda-feira, 27 de junho de 2011

Pedreiras de Vila Nova (parte_2)

Como atrás disse, os rapazes só ficavam no desaterro até aos 11, 12 anos data em que passavam para a fase seguinte na hierarquia do canteiro que era o cabouqueiro, as raparigas até ao casamento, os rapazes que queriam, ou que não eram tão dedicados à arte, ficavam nesta categoria toda a vida os outros, só até aprenderem a cortar a pedra, depois iam fazer a aprendizagem do canteiro. Pela descrição que faço das idades, nota-se qual foi a nossa infância e adolescência que ali foi passada com a adversidade dos tempos, descalços, rotos e com fome à mistura, no meu caso só fiquei até à idade da tropa, 1958, poucos anos depois, com as novas tecnologias de exploração que outras zonas souberam aproveitar e nós não, deu-se o declínio e abandono total destas pedreiras e hoje para as descobrir temos que lutar com as silvas que as cobrem completamente.
Quero aqui realçar da dificuldade de transportar a pedra do fundo das pedreiras até à superfície, para aí ser transformada pelos canteiros, que era assim; - Pelo processo do chamado, “pau e corda”, que consistia em meter umas correntes a abraçar a pedra a transportar e alinhávamo-nos de um lado e doutro, tantos quantos pares fossem necessários, consoante o peso da pedra, que às vezes era, quase sempre maior que o nosso próprio peso, os pares, um era esquerdo e o outro era direito, quando não dava certo, um pegava à renhenha
Este processo é difícil de explicar, depois de enfiarmos um pau, que era a “ panca”, não sei porquê este nome, através da corrente e a regularmos à nossa altura, havia um colega que dava a ordem de arranque e todos nos levantávamos ao mesmo tempo, pois estávamos de pernas um pouco flectidas, para assim levantar a pedra, aos 14, 15 anos já éramos sujeitos a este sacrifício, mas fazíamo-lo com uma certa vaidade, até tínhamos vergonha de não aguentar o mesmo que os homens, “qual exploração infantil”.
Falando de mim, com 73 anos ainda cá estou, para poder contar aquilo que eu pessoalmente passei e o que me foi transmitido pelas pessoas que naquela altura já estavam à beira de partir desta para melhor, porque pior não seria!
Este processo do "pau e corda" já era de progresso, porque nas gerações anteriores era muito pior. No processo de exploração, falta dizer como a pedra era arrancada.

Era assim:
Os cabouqueiros com um picão faziam uma ferroada a todo comprimento da talhada a cortar, depois sentavam-se no chão com as pernas abertas e esticadas fazendo um ângulo recto com o tronco, e com a maceta e um ponteiro abriam uns buracos tão bastos quanto necessários, depois enferravam os pinchotes que eram bocados de aço afiados tipo cunha e à força de marreta a bater-lhe em cima.
Isto era um trabalho duro, pois chegavam a andar horas seguidas com a marreta nas mãos que pesava uns dez quilos, até conseguirem espessarem a talhada do banco, nós chamamos banco às fiadas de rochas sobrepostas umas sobre as outras divididas por aquilo a que chamamos lazins no sentido horizontal, a talhada agora livre era refiada pelo mesmo processo, mas com pinchotes mais pequenos à medida das encomendas, sendo então retiradas a “ pau e corda” para os locais onde era transformada pelos canteiros.
As cantarias aqui elaboradas tinham vários destinos, em especial para Coimbra, o Palácio da Justiça foi construído com pedra toda ida daqui, assim como o Pálace Hotel da Cúria, não há lugar nenhum no concelho de Cantanhede, e muitos fora dele que não tenha a marca da nossa pedra. 


Nota extra: clicar 2 vezes nas fotos, para aumentar. 

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